domingo, 27 de dezembro de 2009

pequenas narrativas cotidianas (parte II)

"nº04"

Sono. Sono. Sono. Sono. Pluma. E a palavra nem sempre é leve como o ato. Andar de pés descalços e trocados, escorar e escorrer no corrimão da escada, achar tudo muito confortável, convidativo ao dormir. E nem sempre a coisa é mais valiosa do que a vontade da coisa.

***

"nº05"

E só depois de um tempo o mau humor explicado. Desligaram o ventilador no meio da noite.

***

"nº06"

Passa em cima do pé da árvore, caminho de ruma das pretinhas, aquela formigarada toda sardosa. Não conta conversa, levanta a perna e se lança. Que filhinho-da-puta.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

pequenas narrativas cotidianas

"nº01"
...e eu só pensava que orar com o pé comprimindo aos 160km/h não era a melhor solução. Ela discordava.

***

"nº02"
A gente sempre acha muito ao acaso, sem mesmo uma escolha muito certa. Mas acredite, só hoje percebi que ele prefere mijar nos formigueiros.

***

"nº03"
Coloco a colher virada, mexo de um lado pro outro, deixando sempre o equilíbrio aproximado entre a ração e a carne. Deus, como isso me deixa calmo. Calmo. E até me esqueço que a comida não é pra mim, mas quem dera fosse. Enquanto isso, lá fora, os gatos passam tão quietos...

sábado, 5 de dezembro de 2009

Ventura

Uma vez eu te disse, na calada da noite, tremendo no frio do inverno: Quem chegar primeiro lá, daquele lado que ninguém vê, manda uma bandeirada bem bonita, de azul listrado, pro outro, e acorda nas boas horas do mundo. Levanta um estandarte, desenha a coluna da nossa escola.
***
Primeiro eu te vi. Ali, vibrando de alegria, em meio à multidão, você parecia santo, certo... Seus olhinhos profundos, duas piscinas de jabuticabas. Azeitonas negras. Aí você me viu, e foi simples como amar, correr, andar, deitar. Simples como o sorriso que você me deu. Deus sabe como te amei naquela hora. Lá fora eu te mostrei os postes, os pombos, as ruas, os carros, as cores que você nunca viu. Te ensinei as horas, o vento. Te afaguei a barriguinha e as orelhas. Nós caminhamos no colo da alegria. Eu parecia um palhaço, e você um trapezista distraído. Gastamos o acaso.
Eram alguns quarteirões até o meu prédio, sete andares acima da calçada. E lá eu te mostrei as alturas, mas você nem ligou. Rodou no meu encalço feito criança, roeu minha calça jeans. Em casa você comeu alguma carne, frango, não sei! Eu sentei no sofá e você, já tão sapeca, pulou do meu lado. Depois você saltou, totalmente imprevisto, e correu esbarrando nas coisas, pisando as roupas sujas, rasgando o lixo. Foi a primeira e última vez que te dei uma bronca. Mas me arrependi. Você me ensinou a amar o estrago e o gasto. Botei um disco qualquer na vitrola e deitei com você no sofá. Naquele dia eu adormeci morno, e acordei sorrindo.
De manhã eu fui comprar o pão, alguma mussarela, salsicha. E até quem me viu na fila sabia que eu tinha te encontrado. Meu último romance. As luzes da matina eram quadriculados suspensos, listras semi-tortas, diurnidade puída. Diminutas perdidas num denso copo de café... enquanto olhava você se lambuzar, me gastei... num copo de café. E a moda migrou à sua maneira, a casa se encheu de ti. Até os meus amigos te adoravam, te abraçavam. Brindei sozinho com você, certa noite. Ao nosso carinho de tocar arranha-céus!
Dispensamos toda e qualquer cigana, que o nosso caminho é trilhado no pé cego, na mão muda. Você é amigo do meu coração. Somos bocas de coleira solta.
Uma vez eu te disse, na calada da noite, tremendo no frio do inverno: Quem chegar primeiro lá, daquele lado que ninguém vê, manda uma bandeirada bem bonita, de azul listrado, pro outro, e acorda nas boas horas do mundo. Levanta um estandarte, desenha a coluna da nossa escola. E um dia, sem nem aviso, você foi. Ruiu numa tarde qualquer, como no dia em que você chegou, e me deu seu olhar. Me perdi em você, sempre soube, sempre quis não saber de nada... assim como fui com você do meu lado. Por horas fiquei te afagando, me afogando. Logo você que era tão cheio de vida, de gostos e desgostos, de rebeldias. Lembrei de quando você se soltou de mim uma vez, e esse foi meu sonho durante vinte anos. É de lágrimas...
Meus vinte anos de não vivência, de ficar olhando, opaco, os pássaros rodopiando pela janela, de deixar o disco soar amargo o fim da tarde toda. Nem saltito mais nas dobras da calçada. Indeciso da cara que tinha que botar, das cores que tinha que pintar, me emoldurei nas minhas roupas, e larguei de mão as notas da melodia. Sentado no meio do meu apartamento eu podia sentir seu narizinho gelado em cada canto de parede, em cada almofada do sofá, em cada roupa... velha... em cada caco da minha alma. Vinte anos, ou mais, já não sei, já não importava mais...
Um dia me deu vontade de correr, e eu me mudei. Me mandei daqui pra lá. Fui morar na boca do mar, como você sempre quis. Eu via as ondas no seu corpinho quando nós voltamos das caminhas do domingo na praia. Eu via ainda as ondinhas, amigão, e sabia que era ali que você queria viver. Nunca pude antes, mas quando sim, fui morar de cara pro vento leste. Meu presente atrasado.
Domingos de terra e sal, vivi. Quando já não distinguia o sentir, sentei na praia e chorei, sorri, cantei a condição de ser sozinho. E aceitei. Até gritei pra você, de onde estivesse: Não solta da minha mão. Me debruça na tua calma, me faz alçar vôo com você, amigão. Não desesperei porque sonhei com você, às vezes. E um dia eu já nem mais tinha lágrimas, que meus olhos já não eram tanto mar.
Fiquei só lá. Esqueci as caras, desmaiei os sonhos, a língua da fala, escorreguei numa curva os meus olhares. Perdi as horas em desfile, desviei do sentir das coisas em grão de areia, errei a morte, e continuei. Me desentendi do céu, e borrei a luz. Sabe-se lá como, desaprendi a vida. Levando calado a obrigação de respirar. Respingo de mar. Fiquei lá escutando o barulho, cadência de sal, da minha barba crescendo. Até desaprendi de mim, mas nunca deixei o tempo lavar você daqui. O vento podia até ir te contar as minhas penas, feito andorinha. É de se entregar.
Mas um dia, na praia, você voltou. O amor chegou, eu estava lá e vi. E se já vinha o vento contra o cais, a maré virando, a vida desacostumou. Doce, o mar ancorou você em mim mais uma vez, e eu só consegui sorrir, que a idade já não deixava bordas pra excesso. Mas você não era grisalho feito eu, era forte. Corria como no primeiro caminhar. Era a felicidade tranqüila do momento mais belo, quando você veio me dizer a bandeira certa pra remar. Sua alegria era de me ter do seu lado, agora pra sempre, onde as essências se abraçam com as desfinalidades, desimportantes acasos como os nossos nós. E eu soube naquele momento o porquê de eu ter te dado o ancestral nome de Saudade. Te abracei, moleza do samba de viver. Te amo...
Levei você pra ver o mar comigo, uma derradeira vez. Mostrei os deletérios, reli as velhas cores, e finalmente me entendi com o céu. Abri o riso em nuvem de fim de tarde, mandei deixar de teima, molhei os pés na praia e dancei o sereno. Falei pra você do mar, do que eu fui nesse tempo desexistente:
- Eu morei dentro dele. Enchi ele do sal dos meus olhos. Passei sempre mais tempo lá dentro do que aqui fora. A gente vai ver ele todo dia, mas nunca vai abusar...
Vambora, filho.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

No nada existencial... (parte V)


"Não perca, na sessão da tarde: Dois funcionários públicos do barulho, que vão deixar você de orelhas em pé. No nada existencial, com Sandra Bullock e Steven Seagal"

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

No nada existencial... (parte IV)












E não percam a próxima postagem: finalmente o coelho vai ganhar um nome!



sábado, 12 de setembro de 2009

No nada existencial... (parte III)













As aventuras de um coelho perdido na mente de alguém muito esquisito.


quinta-feira, 10 de setembro de 2009

No nada existencial... (parte II)































A vida nunca é fácil quando não existe em cima ou em baixo.





quarta-feira, 9 de setembro de 2009

No nada existencial...












As peripécias tediosas e cotidianas do nada existencial. A vida de um coelho que nunca vai poder reproduzir-se.



sábado, 8 de agosto de 2009

Cães em chamas


Verdade seja dita: existem certos tipos de música, certos estilos, que pedem um determinando momento para serem apreciados em sua totalidade sensitiva. Nada como ouvir um surf music enquanto se está preparando para fatiar um desgraçado (créditos ao Tarantino), ou um sambinha pra tomar uma gelada. Música experimental/instrumental para passear com o cachorro, blues para as horas de, vocês sabem, mais "intimidade" do casal... etc. etc. etc. Enfim, o caso é que todos esses estilos, e vários outros, têm seus significados aguçados quando ouvidos em determinados contextos, soando assim de maneira mais autêntica, chegando à perfeição sinestésica, se é que dá pra ser.

Bem, existe também um estilo de música que satisfaz os pés de um motorista queimando pneu nas estradas. Aquele que transforma os nós dos dedos do piloto em rangido puro, o som do asfalto quente, do dorso cinza do continente: o rock'n'roll. Aquele que sempre toca em filme de caminhoneiro, que deixa as mulheres expostas em roupas minúsculas, que faz até o maior nerd se transfomar num junk maluco, como um bando de cachorros pegando fogo. E esse é justamente o nome da banda de que venho lhes falar nessa madrugada insône: Flaming Dogs.

Banda de Natal, terra do sol, e o clima não poderia ser mais propício: calor forte no lombo dos cães. Um quarteto que se propõe a fazer um bom rock regado à influências que vão das mais clássicas, como Stones e Hendrix, às mais recentes, como Hellacopters. Se propões, e cumprem. Domando suas cordas da maneira mais qualificada, aos gritos e berros, o Flaming Dogs apresenta um som muito criativo, cheio de reviravoltas melódicas, harmônicas e rítmicas. Riffs que se combinam e desconbinam no decorrer das músicas, melodias que nos fazem querer estar num carro a toda pelas estradas empoeiradas e esburacadas do RN, rock pra dirigir, são os elementos principais desses caras. Isso sem falar na bateria que tem todo um toque setentista. Viradas muito bem executas, mudanças de ritmo que te deixam aturdido (às vezes você até pensa que está tudo saindo errado, mas não...), e uma precisão nas marcações... realmente uma beleza. Se ouvidos com calma, em casa, facilmente é percebida a diversidade imaginativa das melodias dos cachorros inflamados (assim o nome soa meio infame, ein! hahah). Tudo bem afinadinho e des/organizado para dar o tom certo de barulho que se deseja.

No palco, a destruição pede passagem a galope. Destaque para Leo, um dos guitarristas, e para Fábio, o maquinado na bateria, que são pilhas nas apresentações. Pulos, baquetas que voam, pratos espancados. Se na gravação não se consegue perceber tanto esse espírito noise da banda, ao vivo ele se apresenta de maneira categórica. Uma banda barulhenta, mas com uma qualidade ressaltada.

Música para se ouvir na estrada, num toca fitas velho. Som para tocar num incêndio.

Deixando de lado o único ponto que considero negativo, que é o vocal meio Metallica (cheio de yeaaah), as músicas do Flaming Dogs provam que o teor qualitativo dos músicos potiguares continua em alta.

Que continuem então se apresentando nas noites litorâneas da cidade do morro descabelado, fazendo seu rock'n'roll, fazendo com que as chamas sonoras fiquem cada mais altas. Se ainda não se pode ouvir num carro pelas estradas, pelo menos nas trilhas da mesa de som é possível. Então que assim seja... que se quimem os cachorros (mas só de maneira figurada, que ninguém aqui é babaca para atear fogo num coitado de um cãozinho, não é mesmo criancinhas?!).

terça-feira, 19 de maio de 2009

Enquanto a banda não toca...

A frequência de shows "indie-pendentes" em Natal é grande (e que se entenda o termo anteriormente aspeado como sendo determinação para música alternativa, contrária aos monstros da massificação sonora: Forró e Bahia-Music). Centro Cultural Dosol, Nalva Melo Café e Salão, Projeto musical do Praia Shoping, Sancho Pub, Budda Pub, Sgt. Peppers... dentre outras estantes culturais, essas são algumas das referências que matêm vivo, na cidade camarônica, esse tipo de música de que estamos falando.
Semanalmente, ou findesemanalmente, você poderá encontrar, com alguma pesquisa (e tenho que admitir que nem sempre se consegue), um lugar interessante, um showzinho bacana pra presenciar. Do chorinho no Buraco da Catita, ao duo de baixos Groove/Primata no Praia, passando pelos shows locais e descotecagens (venhamos e convenhamos, sinônimas de ouvir música com os colegas no pc) do Dosol, dá sempre pra colocar as idéias no lugar tomando uma gelada e curtindo algum som.
Não me atrevo a dizer que Natal explode música pelos poros, porque seria um exagero. No entanto, também não podemos dizer que moramos numa cidade muda. Não dá pra esperar o Beatles morto-vivo abrindo show pro Frank Sinatra (também zumbi), mas muita coisa boa já rolou por essas ruas quentes da cidade das praias sujas.
Bom, amigo, enquanto a sua banda predileta não toca, vai curtindo as atrações mais "modestas" das noites Natalinas. Duvido que vá te fazer tanto mal assim...

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Insanos samurais do Inferno!


Lá os impactos dos terremotos são controlados por estranhas, e extremamente complicadas, engenhocas em forma de mola, que aparam essas devastações causadas pelo movimento das placas tectônicas. Nascedouro das altas tecnologias, lugar pico de grandes pensamentos, alimentação saudável e vida longa. É o Japão, e essa é, para muitas pessoas, a única imagem que se tem da cultura japonesa. Ops, perdão, me esqueci dos Samurais, dos pokemons, gueixas, da China, da Coreia do Norte, etc. etc. etc. Enfim, toda essa confusão que nós ocidentais fazemos sobre a cultura oriental é um reflexo direto desse nosso distanciamento tanto geográfico quanto histórico. Mas se nós formos "cascaviar" (palavra da minha mãe, que quer dizer aprofundar, escavar) ao fundo, procurar conhecer um pouco melhor essa outra realidade, iremos perceber nem só de karate e de saquês vive o Japão. Há lá também um bocado de "vidas doentias". E uma pequena porção delas, apenas quatro "malucos", vieram derramar-se em terras carnavalescas. No Dosol, dia 3 de maio, domingo nem um pouco dominical, seja bem vindo à gaiola das aberrações e das criaturas gritantes: é hora de Vivisick.
A banda japonesa de hardcore, em turnê pelo país do sol sal e sexo, apresentou-se em Natal no que mais parecia ser uma explosão de adrenalina dentro do peito do camarada. Chocantes desde o visual, samurai punk, cabelo de árvores, madeixas coloridas... e o baterista magrelinho, os japas entraram no palco com cara de que iriam botar o Centro Cultural a baixo. E o fizeram.
Uma apresentação memóravel para a cena "underground" potiguar, e que sá nacional. Com um som que eu definiria como um hardcore extremo e enérgico, os caras fizerm juz à sonoridade da banda. Os cordas da banda mais pareciam o Elvis levando um puta choque, enquanto o vocalista rasgava sua voz mesmo quando os microfones não estavam funcionando. "Insanos" era a definição de quase todo mundo para aquela banda se apresentando. Realmente insanos.
A boa e velha duplinha do hardcore, sujeira e crueza, se fez presente em todas as músicas do Vivisick. Embora levando um som, aparentemente, simples, a banda ganha notoriedade pela criatividade que utiliza para criar as suas músicas. Linhas de vocal soltas no ar sem "melodias" acompanhando, vocalização sobreposta a uma bateria seca, sem o apoio das cordas, guitarradas ruidosas e rápidas, como de prache, mas sem se tornar as músicas uma repetição do que já foi feito. Uma expressão barulhenta realmente instigante/intrigante, bem sincera e pessoal. Um som foda. Os caras conseguem unir a diversão da música punk com a indignação do hardcore, numa panelada enérgica e distorcida, bem como fazem os seus parceiros do Mukeka di Rato (banda que também se apresentou na mesma noite, mas que infelizmente eu não pude apreciar).
Se me perguntarem se valeu a pena pagar os 15 reais da entrada, mesmo sabendo que eu só puder ver o Frattelli retomando ares(espero falar dessa banda destruidora posteriormente no blog), o Handsome and the Heartbreakers tocando cover do Roberto Carlos em japonês e o show esmagador do Vivisick, eu responderia na lata que "sim", muito embora eu tenha deixado de ver os caras do Fuck on the Beach e do Mukeka.
Fica então a dica pra quem curte um som mais podre e drástico: escutem o Vivisick, saquem as suas músicas indigestas e despretensiosas, é uma boa pedida japonesa, acompanhada com um prato de arroz pra se comer com palitinhos.

sábado, 25 de abril de 2009

Nada de Corcovado, é o Camelo mesmo... e o Hurtmold, ora bolas!

A via costeira de Natal, mais especificamente na área próxima a Ponta-Negra, é um cenário de opulência sem medida. Os hotéis luxuosos, as piscinas em formatos esquisitos, a postura rude dos porteiros perante os transeuntes desavisados é um reflexo direto dessa explosão de egos e dengos monetários. A arrogância dos blocos cimentados diante do mar, esse céu de sal. Tudo isso forma um cenário perfeito para a super potência egotista dos grandes clássicos & classudos da nossa música popular. Como alguém normal, alguém não-divino poderia ir se alojar ali? Devaneio. Mas o que parecia distante e improvável se tornou realidade no dia 20 de Abril: um mendigo teve a sua vez nos grandiloquentes palácios da costeira.
No palco escuro apenas uma cadeira era iluminada, deixando na penumbra os instrumentos à espera de seus domadores. Um banquinho e um violão? Não. A expectativa cresce junto com os gritos dos fãs mais desesperados, até que entra o barbudinho tão esperado. Com a viola na mão, seu jeitão desengonçado de andar, senta na cadeira e dá os primeiros e solitários acordes da sua apresentação. "Caminhando" é a faixa que abre o show "SOU NÓS". Marcelo Camelo, o amado & odiado ex-Los Hermanos, se apresenta ao público com uma canção que diz "Lá vai deus, sem sequer saber de nós". O banquinho e o violão poderiam enganar que algum dos "bons" da bossa iriam se apresentar naquele dia, mas já com essa primeira canção apresenta-se clara a diferença entre os estilos de Camelo e dos Corcovados. Nada de "Garota de Ipanema" pra vocês.
Com o fim dessa vinheta melódica entram os outros músicos do conjunto, e o show começa verdadeiramente. Os seis rapazes do Hurtmold, banda Paulista de som indefinível, acompanham Marcelo nessa sua empreitada solo, desde a gravação de várias faixas do Cd, até às apresentações ao vivo, dando o ar de sua graça. E que graça. Se a ideia principal de um bom artista, quando abandona seu grupo de origem, é a de não se repetir musicalmente, essa desejada disparidade é dada principalmente pelos arranjos demasiado criativos dessa "banda de apoio" (título estúpido). Quando a banda entra em cena, as diferenças entre o som do Los Hermanos e do projeto solo desse ex-vocalista tornam-se acentuadas. Ritmos desconexos, meio fora do tempo, como em "Téo e a gaivota"; melodias dissonantes, como o novo arranjo, belíssimo diga-se de passagem, para "Pois é" do Los Hermanos, deram uma nova cara ao som de Camelo, bem menos música ROCK POPular brasileira. Parece um chamado de "vamos experimentar musicalmente, meu bom mendigo" feito pelos novos amigos de Marcelo.
As músicas, nitidamente bem trabalhadas, repercutem muito bem aos ouvidos de um bom apreciador. Dando destaque para a marchinha de Carnaval "Copacabana", bem mais arrojada ao vivo do que no disco, "Mais tarde" e "Vida doce", belas melodias muito bem desconstruidas pelos "arrumamentos" musicais do Hurtmold, e ao novo arranjo de metais de "Além do que se vê", do Los Hermanos, que encerra o show de maneira caótica e fragmentada, a cada nova repetição do verso melódico um músico sai do palco, terminando somente o trompetista e o baterista, no que mais parece uma sessão de free-jazz, belíssimo. Vale salientar ainda outro grande momento da apresentação, que se dá numa súbita saída de Camelo do palco, quando a banda passe uns 10 minutos numa cacofonia melódica sem fim. Total desconexão aterradora dos instrumentistas, perturbadora até, que só se finda com a consequente a volta do frontman ao palco, em uma retomada paulatina de uma musicalidade mais definida. Bisco fino, meu colegas. Biscoito fino de se ouvir.
Excetuando algumas musiquinhas mais água com açúcar ("Janta", "Doce solidão"), como já bem disseram vários críticos de música do momento, a retomada da vida artística dada por Camelo é plausível e inovadora para os seus padrões. Melhor ainda é o show... e perdoem pela aparente parcialidade, mas grande parte do espetáculo se deve mesmo aos garotos paulistas. Que banda!No mais, recomendo a escuta e, se possível, a presença num show desse mendigo reformulado. Vale a pena, apesar do preço das entradas (a opulência pontanegrense não poderia sair calada nessa, não é mesmo?).

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Primeiras impressões da Terra

"God News, everyone!"

Já ouviram falar em caderneta pra espantar os macacos da cachola? Anotações de manicômio? Escritos para a distração dos esquisofrênicos? Bom, esse espaço tem mais ou menos a mesma funcionalidade: libertar as minhas dúvidas, minhas preferências e desarranjos. No caso desse blog em específico isso se fará através de uma certa dose de crítica musical, sempre relativa ao que acontece e/ou entristece na cidade de Natal.
Não esperem melodramas ou bajulações, idolatrias ou raivinhas. Não sou muito disso. Mas também não se pode viver sem admirar alguém ou algo, não é mesmo? Por isso criei este espaço, para que eu possa expressar, dar vazão ao que penso da cena musical independente da terra dos camarões. Tentando ao máximo uma imparcialidade, obviamente inalcançável, mas não menos desejável, para que eu possa não cair nos bons e velhos achismos egotistas.
Nem só de idolatria vive a música. Ás vezes é bom parar pra pensar antes de enfiar qualquer coisa orelha a dentro.

Abraços

PS: Em breve uma postagem sobre o show do Marcelo Camelo junto com o Hurtmold